domingo, 22 de fevereiro de 2009

Guerra ao terror muda sob Obama

Fim da linguagem e da abordagem unilateralista de Bush reflete transformações no mapa-múndi da jihad

Patrícia Campos Mello

Chegou ao fim a famigerada "guerra global ao terror", declarada pelo então presidente americano George W. Bush em 11 de setembro de 2001, algumas horas depois de aviões pilotados por terroristas islâmicos destruírem as torres gêmeas em Nova York e parte do Pentágono. Não que os EUA tenham vencido os terroristas, longe disso. Mas, sob o comando do presidente Barack Obama, o combate mundial ao terrorismo assumiu contornos diferentes, a começar pela linguagem. O governo Obama abandonou o termo "guerra ao terror", que havia assumido o significado de poder ilimitado e suspensão de leis para combater inimigos difusos - seja no Afeganistão, Iraque, Irã ou Coréia do Norte. A expressão passou a evocar manchas na reputação americana, como Guantánamo e Abu Ghraib.

Indagado numa entrevista à CNN por que não tem usado a expressão "guerra ao terror", Obama afirmou acreditar que os EUA podem conquistar os muçulmanos moderados se escolherem as palavras de forma cuidadosa. "Palavras são importantes nessa situação, porque só podemos vencer essa luta por meio da batalha por corações e mentes", disse Obama. Ele vem usando os termos "luta duradoura contra o terrorismo e extremismo" e "perseguição de extremistas".

"A guerra ao terror é um conceito desacreditado, que rejeitava qualquer limite ao Poder Executivo, transformava o mundo inteiro em campo de batalha e anunciava uma guerra que nunca acabaria", disse ao Estado David Cole, professor de Direito na Universidade Georgetown e estudioso do assunto. "O governo Obama reconhece que o inimigo não é ?o terrorismo?, mas a Al-Qaeda, e crê que podemos combatê-la respeitando a lei."

A mudança de abordagem vem em boa hora. O mapa-mundi do terror islâmico sofreu transformações em várias regiões do planeta nos últimos anos. Os extremistas perderam terreno na Europa e em países como Iraque, Arábia Saudita e Indonésia. Por outro lado, ampliaram seu raio de ação no norte da África, no Afeganistão e em países como Bélgica e Iêmen (leia reportagem nesta página e na página 11).

MÉTODOS ALTERNATIVOS?

Obama percebeu que apenas abandonar a retórica de Bush não é suficiente. As prioridades na luta contra terroristas mudaram: em pauta, retirada de tropas do Iraque, de forma gradual e responsável, concentrar os esforços contra o Taleban no Afeganistão e Paquistão, abertura diplomática com o Irã e usar mais "smart power" (poder inteligente) e cooperação multilateral. Outro passo importante foi o anúncio do fechamento de Guantánamo e das prisões da CIA, além do veto ao uso de "métodos alternativos" de interrogatório de prisioneiros.

"Existe uma determinação maior de trabalhar para a paz entre israelenses e palestinos, especialmente com a indicação do enviado especial George Mitchell, mais ênfase em Afeganistão e Paquistão e diálogo com Irã. Mas, principalmente, há um senso maior de realismo em relação ao que pode ser alcançado", diz Paul Rogers,professor da Universidade de Bradford e autor de Why We?re Losing the War on Terror ("Por que estamos perdendo a guerra ao terror").

O Afeganistão - ou, como encara a inteligência americana hoje, o AfPak, união entre o Afeganistão e o Paquistão, onde ficam os santuários de terroristas - transformou-se no principal front da nova guerra ao terror. E a estratégia no Afeganistão deve se concentrar em assegurar estabilidade regional e eliminar santuários do Taleban no Paquistão, em vez de construir uma democracia sólida e economia próspera no Afeganistão, como pregava o governo Bush.

No Iraque, a estratégia de continuar passando gradativamente o poder para os iraquianos e retirar as tropas se mantém, embora muitos temam que os EUA terão de manter uma presença no país por muitos anos.

Mas, apesar de toda a mudança de rota, Obama evitou uma ruptura completa e rápida com o governo Bush em algumas áreas, especialmente táticas contra o terrorismo, frustrando ativistas de direitos humanos. Vários dos indicados de Obama apoiam a detenção de terroristas por tempo indeterminado, mesmo aqueles capturados longe de zonas de guerra. O governo Obama também endossou a teoria de que "segredos de Estado" inviabilizam que ex-presos da CIA processem os EUA.

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