Ellen Barry Do New York Times, em Moscou
Em agosto do ano passado, uma nova Rússia se apresentou para o mundo. Do campo de batalha da Geórgia, a mensagem dizia: Nós não buscamos mais a opinião positiva do Ocidente. O novo gosto pelo confronto foi visto por muitos como resultado da riqueza em petróleo e gás, que deu aos líderes russos a confiança para se arriscar ao isolamento internacional. No título de um livro publicado em abril, o acadêmico Marshall Goldman ofereceu uma explicação sintetizada: "Petroestado".
Essa tese pode ter uma vida útil curta. Os líderes russos, não mais esperando fazer do rublo uma moeda de reserva internacional, hoje enfrentam uma confluência de desastres: o preço do barril de petróleo caiu para menos de US$ 40, as ações da Gazprom despencaram 76% em um ano, e mais de um quarto das reservas em dinheiro da Rússia foram gastas para valorizar o rublo.
No entanto, podemos esperar um degelo nas relações entre a Rússia e os Estados Unidos?
A questão surge em um momento de grande tensão. O impasse entre a Rússia e a Ucrânia em relação ao preço do gás tem envolvido toda a Europa; a violência na Geórgia poderia explodir novamente. Planejadores de políticas externas em relação à Rússia do governo de Barack Obama estão assumindo seus cargos sob a pressão dos recentes eventos.
Henry Kissinger, que esteve em Moscou no mês passado, oferece o ponto de vista esperançoso de que a crise financeira global poderia levar a "uma era de interesses compatíveis". Porém, outros veem a crise empurrando a Rússia no sentido oposto. Assim, temos dois caminhos:
Cenário 1: Cooperação
No colapso financeiro global, como colocou Alexander Rahr, do Conselho de Relações Exteriores da Alemanha: "Todos nós enfraquecemos. Todos nós ficamos mais pobres". Dessa forma, pressionados por preocupações domésticas, ambos os lados reduziram suas ambições estrangeiras. Washington retarda seu calendário de expansão da Otan e defesa a base de mísseis; a Rússia adia o sonho de recapturar a "esfera privilegiada de influência" soviética. Líderes em Moscou apresentam isso ao público como uma vitória.
A lógica aqui é direta: uma Rússia de cintos apertados, financeiramente falando, precisaria do dinheiro e da tecnologia do Ocidente para desenvolver seus campos de energia. Monopólios estaduais buscariam sócios estrangeiros e demonstrações de poder, como as últimas ações da Rússia contra a BP e a Shell Oil pareceriam contraproducentes. A "batalha de ideias" dentro do Kremlin, como descreve Igor Y. Yurgens, consultor do presidente Dmitri A. Medvedev, se afastaria do "isolamento, reclusão, instintos imperiais" e iria em direção a uma parceria de longo prazo com o Ocidente.
"Se respondermos à crise nos isolando, se não aprendermos as lições com o que está sendo feito, então o destino da Rússia poderá ser a repetição do destino da URSS", disse Yurgens. "Não somos tão estúpidos assim".
Cenário 2: Retração e nacionalismo
"Menos recursos significa comportamento mais egoísta", afirmou Sergei A. Markov, diretor do Instituto de Estudos Políticos em Moscou. Nesse caso, a Rússia se encontra diante de um conflito internacional e da ameaça de um separatismo regional, sem a grande quantidade de dinheiro do petróleo para desembolsar na esperança de manter o controle. Forçada a lutar por sua própria sobrevivência, líderes políticos ajustaram suas diretrizes à opinião pública nacional. Seu foco no inimigo externo – os Estados Unidos, cujos líderes já foram culpados pela crise financeira na Rússia, e com quem a Rússia já está profundamente irritada em relação à possibilidade da influência militar americana alcançar a Ucrânia.
Nessa lógica, seria um absurdo ceder terreno para o Ocidente agora, depois do tão esperado gostinho de satisfação que os russos conseguiram com a Geórgia. Muitos russos veem a guerra de agosto como uma restauração do devido lugar da Rússia nos eventos mundiais – não um produto da riqueza do petróleo, mas da recuperação da sociedade russa após o colapso da União Soviética.
"A Rússia voltou, ponto", disse Vyacheslav A. Nikonov, presidente da base política aliada ao Kremlin. "Isso não vai mudar. Não vamos ficar embaixo da mesa de novo".
Qual desses cenários é o mais provável? Para começar, está claro que as autoridades russas estão se preparando para defender seu poder político. Depois de se apresentar para o mundo como um modernizador liberal, Medvedev priorizou uma grande reforma – prolongar o mandato presidencial para seis anos. Este mês, ele assinou uma lei eliminando processos judiciais diante de jurados para "crimes contra o estado", e uma legislação pendente expandiria a definição de traição.
As autoridades estão nervosas, ao que parece. Medvedev, em discurso, enviou uma mensagem espinhosa para "aqueles que buscam provocar tensão na situação política". No mês passado, batalhões de choque da polícia foram enviados a 9.600 km de Moscou para Vladivostok, onde centenas de pessoas protestavam contra tarifas de automóveis, relatou a agência The Associated Press. "Acho que eles não confiam no que não podem controlar", disse Clifford Kupchan, do Eurasia Group, uma empresa de consultoria de risco global, baseada em Nova York. "O reflexo instintivo deles é apertar o cerco quando enfrentam incertezas."
O primeiro cenário, no qual considerações econômicas ditam uma política externa mais sutil, exige condições talvez não existentes. No governo, liberais econômicos podem desafiar os linha-dura. O eleitorado que poderia respaldá-los são os mesmos que silenciaram durante o boom.
"Pessoas com ombreiras que se sentem da classe média, pessoas da burocracia que se sentem da classe média, todos eles poderiam ser parte dessa coalizão", disse Yurgens. "Se essa coalizão será forte o suficiente, não tenho como saber."
Nesses dias, Stephen Sestanovich, experiente membro do Conselho de Relações Exteriores, afirmou enxergar sinais de "confusão política" à medida que líderes de Moscou se adaptam à repentina derrapagem econômica da Rússia. Moscou deixou a crise na Geórgia ir diminuindo, mas aumentou as tensões com a Ucrânia envolvendo o gás.
A escolha da elite, disse Sestanovich, é se eles vão continuar a falar de uma forma que os faça parecer "perturbadores e ranzinzas que gostam de assumir riscos".
"Ainda é essa a visão real deles mesmos, e de uma política adequada em época de crise?", ele disse. "Pode ser. Mas não tenho certeza, acho que eles também não."
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