A China deverá pautar sua expansão militar ao longo da próxima década pensando em garantir seus interesses econômicos, e não em construir uma hegemonia militar que ameace a segurança de seus vizinhos - ou a de outras potências mundiais. Essa é a opinião de analistas ouvidos pela BBC Brasil. Para eles, são pequenas as chances de a China - que quer chegar a 2020 como uma potência econômica respeitada internacionalmente - se envolver em algum conflito militar no futuro próximo.
Dona do maior Exército do mundo, de um arsenal nuclear e de uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, a China vem investindo pesado nos últimos anos na modernização de suas Forças Armadas e já tem o segundo maior orçamento militar do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Especialistas afirmam que esse poderio militar seria usado para garantir uma política externa pacífica e multilateral, baseada no preceito da não-intervenção em temas internos de outros países.
"A China agora sente que precisa de mais poder militar porque seus interesses econômicos são mais amplos", observa Tim Huxley, diretor do escritório regional da Ásia do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS), de Londres.
"Não acho que eles estejam desenvolvendo seu poder militar pelo poder militar em si, mas como parte do processo de se tornar uma grande potência", diz.
Na avaliação de Christian LeMiere, editor-analista da Jane's, organização internacional especializada em defesa, "a prioridade da China no momento é continuar com seu crescimento econômico de maneira calma e pacífica, para construir um ‘soft-power' (influência econômica, política e cultural sobre outros países) em vez de ‘hard-power' (poderio militar)".
Steven Tsang, diretor do programa de Estudos Asiáticos da Universidade Oxford, na Grã-Bretanha, concorda com essa visão. "A China não está planejando construir, nos próximos 10 ou 15 anos, uma força capaz de fazer frente aos Estados Unidos. Isso simplesmente não pode ser feito", afirma.
Para Tsang, a capacidade militar da China é equivalente à sua dimensão econômica, e serve primariamente para preservar seus interesses econômicos no mundo, como foi o caso do envio de navios para o Golfo de Aden no ano passado, para proteger embarcações chinesas dos grupos de piratas somalis.
Ele observa que a China é hoje o membro permanente do Conselho de Segurança da ONU que mais contribui com tropas para as forças de paz das Nações Unidas, e comenta que o país poderia demonstrar sua boa vontade assumindo o controle, por exemplo, da missão de paz na região de Darfur, no Sudão.
Para Tim Huxley, do IISS, no entanto, fatos como esses são na realidade uma demonstração da capacidade de mobilização militar da China, o que pode contribuir para aumentar o temor sobre a ascensão chinesa e desestabilizar a correlação de forças na região.
"Conforme a China se torne mais forte e mais confiante, me parece inevitável que comece a se comportar como outras forças ocidentais se comportam. Vão encontrar situações nas quais terão que intervir, seja para proteger seus cidadãos ou em conexão com disputas territoriais, por exemplo", avalia.
Orçamento em alta
A China gastou no ano passado 418 bilhões de iuans (cerca de US$ 61 bilhões) com defesa, o equivalente a cerca de um décimo do orçamento militar dos Estados Unidos.
Mas, segundo cálculos da Jane's, o orçamento militar chinês cresceu 178% nos últimos sete anos. Se mantiver o ritmo de crescimento, os gastos militares da China podem chegar em 2020 ao equivalente à metade dos gastos dos Estados Unidos.
Em um relatório militar bienal, publicado em janeiro, a China argumenta que seus gastos militares ainda são pequenos se comparados proporcionalmente ao seu PIB (Produto Interno Bruto).
De acordo com o documento, em 2007, a China gastou 1,8% de seu PIB em defesa, enquanto o orçamento militar americano consumiu 4,5% do PIB do país.
Outros países como Rússia (2,5% do PIB), Reino Unido (2,7%) e França (1,9%) também teriam gasto mais, proporcionalmente.
Prioridade
A principal prioridade para a estratégia militar chinesa hoje é a questão de Taiwan, território separado na prática com a instalação de um governo nacionalista após a vitória dos comunistas na China continental em 1949, mas considerado pelo governo chinês como uma "província rebelde" e parte integrante de seu território.
A tensão entre China e Taiwan - que tem o apoio militar dos Estados Unidos - vem sendo reduzida nos últimos tempos com a assinatura de acordos de comércio e para permitir o trânsito de turistas.
Tsang, da Universidade Oxford, não vê possibilidades de mudanças na natureza do conflito com Taiwan no médio prazo, mas considera que o atual fortalecimento militar da China serve para "construir uma força capaz para evitar que os Estados Unidos interfiram quando eles decidirem que chegou o momento de resolver a questão de Taiwan".
Segundo ele, a China prefere não ter que recorrer ao uso militar contra Taiwan e espera que apenas que a dissuasão seja capaz de convencer o governo de Taipei a negociar uma reunificação pacífica, evitando que os Estados Unidos se envolvam no conflito.
"O maior temor de Taiwan hoje não é de dominação militar pela China, mas de dominação econômica pela China", comenta Christian LeMiere, da Jane's. "Taiwan é hoje uma economia que depende da China para mais de 40% de seu PIB, e isso deve crescer conforme eles aumentem seu comércio bilateral".
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