quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Ainda deveríamos estar no Afeganistão?

The New York Times
Anne Applebaum

Talvez tenha sido a temporada sangrenta e trágica de batalhas neste verão; talvez o desapontamento com as eleições, com baixo comparecimento, violência e acusações de fraude. Independentemente da razão, a guerra afegã subitamente está no centro do debate político em vários países do Ocidente. Em jogo não estão apenas táticas e métodos e sim uma questão mais fundamental: ainda deveríamos estar no Afeganistão?

Apesar de dizerem que a cultura política na América do Norte e na Europa é muito diferente, os argumentos são impressionantemente similares. Nos EUA, o colunista do "Washington Post" George Will acaba de salientar que a guerra afegã já durou mais que as duas guerras mundiais juntas. Na Alemanha, o ministro da defesa causou revolta quando previu que as tropas alemãs podem permanecer no Afeganistão mais uma década; líderes da oposição imediatamente começaram a pedir uma retirada muito mais rápida. Diante da desaprovação do público, os canadenses tiveram que prometer a retirada das tropas até 2011. Os holandeses supostamente devem deixar o país em 2010. Em uma conferência em que estive recentemente em Amsterdã, o público aplaudiu quando um expositor criticou a guerra. Demandas por um prazo -"mais dois anos e depois saímos"- são ouvidas em quase toda parte.

Igualmente universal (e bipartidárias) são as reclamações que os objetivos da guerra não são claros ou realistas. Um oficial britânico renunciou na semana passada porque não acreditava mais que a nação aceitaria as justificativas do governo pela guerra, que foram desde "combater terroristas" até controlar as exportações e heroína. O colunista Tom Friedman do "New York Times" exigiu saber "quanto vai custar, quanto tempo levará e quais interesses americanos tornam (a guerra) atraente". Outros reclamam que deveríamos nos concentrar nos "verdadeiros" problemas, como o Paquistão, ou em uma solução "alcançável", qualquer que seja.

Quando você pensa a respeito, tudo isso é muito estranho, já que os objetivos da guerra nunca estiveram em questão em qualquer capital europeia ou norte-americana. "Vencer" significa que saímos com um governo minimamente aceitável em funcionamento; "perder" significa que o Taleban assume e a Al Qaeda volta -e ninguém jamais fingiu que o sucesso seria fácil. A questão é que esta guerra nunca foi adequadamente explicada para a maior parte das populações que a estão travando. Por anos, foi sempre a "guerra boa", em contraste com a "guerra ruim" no Iraque, e ninguém sentia a necessidade de explicar mais.

Os resultados desse silêncio estão mais visíveis nos países europeus nos quais o público foi levado a acreditar que suas tropas não estão de fato lutando no Afeganistão, mas participando de uma operação de caridade armada de longo prazo. Os alemães, por exemplo, ficaram profundamente perturbados quando souberam que um comandante alemão tinha pedido um ataque aéreo da Otan que matou pelo menos 90 afegãos em Kunduz na semana passada. Essa notícia surpreendeu os alemães que pensavam que seus homens estavam no Afeganistão fazendo trabalhos de reconstrução. Os americanos parecem chocados em saber que os Marines lutaram neste verão para retomar áreas anteriormente seguras, que as eleições não seriam tranquilas e que o governo do presidente Hamid Karzai era corrupto. Tudo isso já está claro há algum tempo. Mas quem falava disso?

Acompanhando a opinião de um dos mais esclarecidos especialistas da região, Ahmed Rashid, eu argumentaria que a situação afegã ainda não está totalmente perdida. Escrevo às vésperas das eleições, há ainda uma maioria definitiva no país que não apenas deseja a paz, mas também alguma versão de democracia. O governo central ainda tem alguma legitimidade, apesar de talvez não durar muito. O plano de aumentar o número de soldados em um futuro próximo para dar ao exército afegão tempo para se fortalecer no longo prazo não é estúpido nem inocente, particularmente se acompanhado de investimentos substanciais em estradas e agricultura. Mas tal plano não pode ser executado sem o apoio do público, e este não existirá sem fomento por parte dos políticos.

Portanto, este é o momento de Barack Obama demonstrar que sabe persuadir. Uma ou duas viagens rápidas à Europa e um pedido por trás das cenas por "mais tropas" não vão dar conta do recado: o público europeu talvez ainda goste mais de Obama do que de Bush, mas não acredita que esteja mais compromissado com o Afeganistão do que seu predecessor. Tampouco os americanos ficarão convencidos com um ou dois discursos, independentemente da elevação da retórica ou da elegância da frase.

Dos dois lados do Atlântico, Obama precisa convencer e estimular, produzir planos e evidências, mostrar que reuniu o melhor pessoal e o maior número de recursos possível -em outras palavras, fazer campanha, e intensa. Se o debate da saúde vai determinar sua sorte doméstica, o resultado no Afeganistão vai realizar ou destruir sua política externa. Ele disse muitas vezes que apoia o princípio da guerra afegã. Agora vamos ver se apoia na prática.

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