quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Afeganistão e o azar de Obama de ter o Bush errado como antecessor

por Gustavo Chacra

Bill Clinton e Barack Obama tiveram antecessores que se chamavam George Bush. Mas a herança do marido da secretária de Estado foi incomparavelmente melhor do que a do atual ocupante da Casa Branca. Basicamente, porque o Bush-Pai era realista e o Bush-Filho um neo-conservador - lembre que Clinton e Obama são liberais.

Em 1990, pouco depois do fim da Guerra Fria, Saddam Hussein ocupou o Kuwait. Os EUA possuem enormes interesses no território kuwaitiano – no caso, o petróleo. Bush deu um ultimato para Saddam, um antigo aliado americano, se retirar do país vizinho. Ao mesmo tempo, montou uma coalizão com o apoio de quase todos os países árabes e de muitos ao redor do mundo.

Como o líder iraquiano não respeitou a exigência de se retirar, Bush-Pai ordenou um ataque que, em poucos dias, conseguiu obrigar os iraquianos a deixarem o Kuwait e ainda impôs uma série de medidas restritivas a Saddam. O Kuwait ficou livre, o petróleo voltou a circular e Saddam ficou enfraquecido no poder, mas servindo ainda como um tampão para o regime iraniano não expandir a sua influência pelo Oriente Médio. Para completar, as baixas civis foram mínimas e praticamente nenhum americano morreu. Bush-Pai e seu secretário de Estado, James Baker, são realistas.

Depois do 11 de Setembro, Bush-Filho atacou o Afeganistão. E também contou com o apoio de uma coalizão internacional. Seu objetivo era bem mais amplo e ambicioso. Eliminar a rede terrorista Al Qaeda e remover o Taleban do poder. Conseguiu apenas a segunda. Foi uma guerra realista.

O erro ocorreu em 2003. Bush deixou o realismo e agiu de uma forma descrita como neo-conservadora. O Iraque não havia atacado os EUA, não possuía armas de destruição em massa, estava sob restrições impostas pela ONU e ainda servia como tampão para o Irã, conforme explicado acima. Basicamente, a única justificativa para atacar Saddam, que nada tinha a ver com a Al Qaeda, seria implementar a democracia no Iraque. Esta não é uma política realista e esteve restrita apenas aos iraquianos, afinal Egito, Jordânia e Arábia Saudita não são democráticos e, mesmo assim, mantêm alianças com os americanos.

Ao priorizar esta guerra neo-conservadora em detrimento da realista, no Afeganistão, Bush-Filho se perdeu. No final, depois do bem sucedido surge (uma estratégia realista, que enxerga a situação como ela é, defendendo acordos com líderes tribais) e com dezenas de milhares de mortos, incluindo 4 mil americanos – mais do que no 11 de Setembro –, o ex-presidente ordenou a retirada. Mas a herança para Obama estava no Afeganistão, a guerra realista e esquecida. O Taleban havia se fortalecido, o Paquistão se deteriorado e com bases da Al Qaeda.

Agora, oito anos depois, Obama, um liberal, terá a sua guerra. Clinton, outro liberal, não teve este problema, porque o Bush-Pai-Realista deixou a casa arrumada para ele. O Bush-Filho-Conservador não. Vamos ver como o Nobel da Paz irá se sair. O problema é que, neste caso, a Guerra do Afeganistão, realista há oito anos, se tornou praticamente neo-conservadora. Uma difícil batalha para um liberal.

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