Miguel Ángel Bastenier
O presidente americano, Barack Obama, deu uma virada radical na forma de ver o mundo de seu antecessor, George W. Bush, mas ainda não completou nenhum dos novos percursos que planejou. Não instalará os mísseis na Europa que preocupavam a Rússia; mas em troca negociará com o Irã a partir de 1º de outubro; deu uma volta no discurso pró-israelense no Oriente Médio; suprimiu as limitações econômicas mais severas do embargo a Cuba; prometeu um rascunho e nova conta sobre a mudança climática; concordou que no Iraque não haja tropas de combate americanas no final de 2011; balbuciou com alguma convicção que no Afeganistão é preciso negociar além de combater, e está lutando para que nos EUA se estabeleça algum tipo de previdência social.
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O presidente dos EUA, Barack Obama, observa o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu e o presidente palestino Mahmoud Abbas apertarem as mãos em Nova York
E, assim como o ex-secretário de Estado, o presidente entende que o centro geopolítico do tabuleiro é constituído pelo conflito árabe-israelense, porque de sua eventual solução deveria se seguir um tsunami positivo do Iraque ao Irã, passando por esse casamento de inconveniência que é a dupla Afeganistão-Paquistão.
Assim, em 4 de junho passado, Obama pôs a bola para rodar com o discurso mais equilibrado entre sionismo e palestinismo já pronunciado por um presidente americano: terra e paz para todos, mas não à ditadura das armas, senão algo razoavelmente parecido com a Resolução 242 da ONU, que exige a retirada total por Israel da Cisjordânia e de Jerusalém Leste.
A ideia de começar por tudo ao mesmo tempo tem sua lógica. O presidente havia convocado na terça-feira em Nova York o presidente da Autoridade Palestina, Mahmud Abbas, e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, para conseguir que, embora dificilmente o mundo o engula, ambos dissessem que retomariam as conversações de paz. E, contrariamente, se adiasse esse começo até a aprovação de uma lei sobre a reforma da saúde pelo Congresso, a deterioração não mais do conflito no Oriente Médio - que está em seu grau máximo -, mas de guerras relacionadas poderia ser tal que não ficasse nada para sanear. O problema reside, no entanto, em que esse plano de força exercida simultaneamente em várias frentes só tem sentido quando o ator possui os meios para desencadear uma grande ofensiva, quando sobra capital político e, diferentemente, se mostra pouco apto para a defensiva.
Na data de junho em que Obama começou a espalhar cartas sobre a mesa, um conhecedor excepcional do conflito como o britânico Patrick Seale quase se entusiasmou com a abertura do jogo presidencial e previu um choque de trens entre Jerusalém e Washington; mas hoje é muito mais comedido, porque não está nada claro que a Casa Branca possa ou queira medir-se em duelo com o sionismo universal.
As recentes viagens à região do enviado especial do presidente, o maronita George Mitchell, quase fazem invejar as cerca de 20 inutilidades em forma de visitas que sua antecessora com Bush, a secretária de Estado Condoleezza Rice, fez a Israel e Palestina, exibindo a impossibilidade de uma diplomacia que estava abandonada de antemão. O governo israelense só quer uma paz que seja praticamente gratuita: retirada à la carte de onde lhe der vontade e nem um metro sacro de Jerusalém Leste; inflação de colonos onde lhe agrade; desmilitarização líquida, sólida e gasosa de um futuro Estado palestino; desarticulação ou preferencialmente aniquilamento do movimento terrorista Hamas e solução às custas de alguém de fora do problema dos 4 milhões de refugiados palestinos.
E não se trata de propostas táticas para ir-se despindo delas como os véus de Salomé, mas de princípios inalienáveis de quem percebeu a fragilidade congênita do adversário, com um mais que duvidoso suporte no Congresso. Por isso Barack Obama se encontra hoje em um aperto e a solução de tudo ao mesmo tempo corre o risco de se transformar em quase nada, em qualquer momento.
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