Os jornais do mundo trazem a notícia de que turcos e armênios chegaram a um acordo sobre o genocídio e estabeleceram relações. A informação é correta, mas precisamos fazer algumas ressalvas. Afinal, quem fez acordo foi o país Armênia que não é composto por descendentes das vítimas do genocídio.
Na verdade, o povo armênio era dividido entre o Império Russo e o Otomano desde início do século 19. Os que sofreram os massacres e posteriormente o genocídio são os armênios “otomanos”, que residiam na Anatólia, hoje parte da Turquia. Os sobreviventes fugiram para áreas árabes como o Líbano, Síria e a Palestina. Até hoje, há milhares de armênios em Beirute, Damasco, Aleppo e Jerusalém.
Muitos, assim como sírios, libaneses e palestinos, imigraram para a América. As principais concentrações de armênios são em Los Angeles, Long Island, Las Vegas e Buenos Aires. Em geral, são reconhecidos pelo “ian” no fim do sobrenome. Mas há exceções, como o tenista Andre Agassi. Eles ainda lutam pelo reconhecimento do genocídio armênio nos EUA, onde estabeleceram um forte lobby e contam com a ajuda da presidente do Congresso americano, Nancy Pelosi, eleita em um distrito majoritariamente armênio. Países como Líbano, Síria, França e Argentina, assim como o Estado da Califórnia, reconhecem o genocídio.
Os Estados Unidos, porém, ainda não admitem oficialmente que ocorreu o genocídio de armênios. Em parte, por causa da força da Turquia, integrante da OTAN. Mas também existe a pressão do lobby de Israel, representado pela AIPAC, que atua em defesa dos interesses turcos, contra o reconhecimento do genocídio. Esta atitude provoca fissura na comunidade judaica dos EUA, que considera lamentável esta atitude da AIPAC, já que os judeus também foram vítimas de genocídio no Holocausto e deveriam estar do lado dos armênios, não dos turcos.
O país Armênia, com capital em Yerevan, é resultado da independência das áreas armênias pertences ao Império Russo. Posteriormente, a Armênia passou a integrar a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Depois do colapso soviético, os armênios novamente se proclamaram independentes. Neste momento, a Turquia reconheceu o novo Estado. O choque, porém, se deu pela questão de Nagorno Karabakh, uma área disputada entre a Armênia e o Azerbaijão. A Turquia optou por ficar do lado dos azeris e rompeu com a Armênia. Agora, os dois lados chegaram a um acerto sobre este tema. Já o genocídio não é tão polêmico, pois os armênios de Yeravan não foram as vítimas.
O lobby armênio em Washington e também em Beirute está inconformado com Yerevan querendo assumir a posição de negociador desta questão. Os armênios até hoje dizem se sentir mais à vontade como libaneses, palestinos (os de Jerusalém se consideram palestinos e não simpatizam com Israel) e sírios do que entre os armênios de Yerevan.
Portanto, existe o povo armênio da diáspora, vítima do genocídio, e o país Armênia, que resultou do Império Russo.
Os armênios são um povo cristão, em sua maioria ortodoxa, mas também com alguns católicos. Além do Império Russo e Otomano, eles também viviam na antiga Pérsia. Muitos ainda vivem no Irã. O próprio Agassi é originalmente iraniano. Kia Joorabchian, que teve negócios com o Corinthians, também. Eles falam armênio, com diferenças acentuadas entre os de Yeravan e os da diáspora. O alfabeto é mesmo. A culinária é distinta, com os da diáspora adotando hábitos mais próximos de libaneses e sírios. Como escrevi aqui outro dia, o restaurante que mais gosto em Beirute é armênio.
Os armênios, no Líbano, Síria e territórios palestinos, são tão aceitos quanto os árabes.
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