segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

A América Latina põe Barack Obama sob pressão

Le Monde
Paulo A. Paranaguá

Desde sua posse, Barack Obama telefonou a vários dirigentes latino-americanos. A América Latina pressiona o novo presidente americano a retirar o embargo contra Cuba. "O bloqueio deve ser retirado para que Cuba possa ter uma vida normal", declarou o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, no dia 19 de janeiro. "A sociedade cubana poderá fazer mais quando caírem as barreiras comerciais", acrescentou sua colega argentina, Cristina Kirchner, no mesmo momento, durante uma visita a Havana.

O fim do embargo se tornou o mínimo denominador comum da América Latina, dividida pelas expectativas a respeito de Obama. Apesar da autonomia crescente da maioria dos países em relação aos Estados Unidos, alguns esperam estabelecer novas parcerias políticas e econômicas. Em compensação, outros Estados não estão prontos para desistir do recurso do "anti-imperalismo". "Ninguém deve se iludir, trata-se do império americano", disse o presidente venezuelano Hugo Chávez, no mesmo dia da posse de Obama.

A escolha de Hillary Clinton como secretária de estado foi bem recebida pelos latino-americanos. Por diversas vezes Hillary ressaltou que os Estados Unidos deveriam estar mais presentes no subcontinente, pelo próprio interesse. Ao longo de sua carreira, a esposa de Bill Clinton visitou países da América Latina e do Caribe e encontrou vários chefes de Estado, como a presidente do Chile, Michelle Bachelet, em Washington, em 2006.

Hillary demonstrou sua compaixão pelas vítimas do furacão Mitch, na América Central, em 1998. Ela votou no Senado a favor da construção do muro na fronteira com o México, mas contra as preferências comerciais consentidas aos países andinos em troca de seus esforços na luta contra o tráfico de drogas. Ela também votou contra o tratado de livre-comércio com a Colômbia, apoiado pelo ex-presidente Clinton.

Na ocasião de sua audição no Senado, Hillary se disse pronta para aproveitar as novas oportunidades na América Latina, como a aliança energética sugerida por Obama. Uma forma de diversificar a agenda regional de Washington, concentrada na luta antidrogas, o livre-comércio e as imigrações.

Durante a campanha eleitoral, Obama havia prometido retirar as restrições impostas por George Bush às viagens a Cuba dos americanos de origem cubana e aos fundos enviados a seus parentes residentes na ilha.

O diário "Miami Herald" estima que a nova administração poderia ir mais longe. Washington deveria facilitar a obtenção de vistos para os universitários, intelectuais, artistas e estudantes cubanos, sobre a base da reciprocidade, o que presumiria um acordo com Havana. Tal medida acabaria compensando a queda no turismo que Cuba poderia sofrer com a crise mundial.

Peter Hakim, presidente do think tank Inter-American Dialogue, em Washington, acredita que os Estados Unidos também poderiam dar sinal verde aos créditos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e às iniciativas da Organização dos Estados Americanos (OEA), da qual Cuba foi excluída em 1962.

O subsecretário de Estado Thomas Shannon, encarregado da América Latina desde outubro de 2005 e apreciado no continente latino-americano, deverá permanecer em seu posto pelo menos até a Cúpula das Américas, no dia 17 de abril em Trinidad e Tobago. Essa perspectiva de certa forma alivia a entrevista concedida ao diário espanhol "El País", no dia 11 de janeiro, quando afirma que um "diálogo" ou mesmo um "acordo" na luta contra o narcotráfico seria "lógico". "Não temos conversas formais com os cubanos sobre esse assunto, mas às vezes compartilhamos informações", ele explicou.

Se para Shannon o objetivo continua sendo "promover uma transição pacífica em direção à democracia", a começar pela libertação de prisioneiros políticos, "as mudanças em Cuba serão provocadas pelos próprios cubanos". "Raúl Castro tomou medidas que mostram sua vontade de abrir espaços econômicos e sociais", destacou Shannon. "Mas é um governo conservador, obcecado pelo controle do ritmo da mudança, o que não funciona".

Os Estados Unidos se tornaram o principal fornecedor de alimentos e o quinto maior parceiro comercial de Cuba, mas a importância simbólica do embargo continua forte. Enquanto os americanos exigem compensações, o ex-ministro mexicano de relações exteriores, Jorge Castañeda, pede por uma retirada unilateral do embargo. Em troca, ele propôs, em um discurso publicado pelo "El País" em 20 de janeiro, que os "atores-chave" - o Brasil, o Chile, o México e a Espanha - se comprometem a buscar uma padronização das relações entre Washington e Havana, favorecendo, por fim, a democratização em Cuba.

Os latino-americanos parecem remeter ao "Yes, we can" de Obama afirmando "Si, se puede" para o fim do embargo. Os cubanos parecem céticos. O opositor social-democrata Manuel Cuesta Morua não acredita que "o governo cubano esteja interessado no diálogo ou no fim do embargo". Ele diz que "isso os privaria de pretextos para seus erros, o rei estaria nu".

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